Em meio a possíveis tensões diplomáticas entre o Brasil e os Estados Unidos, uma questão estratégica voltou ao debate: a dependência brasileira do sistema GPS, controlado pelos norte-americanos. Caso um cenário extremo ocorra e os EUA decidam restringir ou degradar o acesso ao sinal de GPS no território brasileiro, a pergunta que surge é direta: o Brasil tem alternativas?
A resposta é sim. Duas potências emergentes, China e Índia, já possuem seus próprios sistemas de navegação por satélite e podem oferecer suporte ao Brasil em caso de necessidade. Esses sistemas são o BeiDou, da China, e o NavIC, da Índia.
O BeiDou foi lançado oficialmente pelo governo chinês e atingiu cobertura global em 2020. Desde então, passou a ser uma das principais alternativas ao GPS norte-americano, ao lado do Galileo, da União Europeia, e do GLONASS, da Rússia. Hoje, dispositivos modernos como celulares, drones e equipamentos agrícolas já são compatíveis com o BeiDou, inclusive no Brasil. Marcas como Huawei, Xiaomi e outras empresas asiáticas comercializam aparelhos que recebem o sinal chinês em território brasileiro sem necessidade de ajustes.
Além disso, o BeiDou tem apresentado níveis crescentes de precisão e estabilidade. Em algumas regiões do mundo, o sistema chinês chega a superar o GPS em desempenho, especialmente em áreas urbanas densas, onde o sinal pode ser bloqueado por prédios. O BeiDou também oferece serviços exclusivos, como envio de mensagens de curta distância via satélite, o que pode ser útil em situações de emergência ou ausência total de internet.
A Índia, por sua vez, criou o IRNSS, conhecido internacionalmente como NavIC. O sistema ainda possui cobertura regional, voltada principalmente para o subcontinente indiano e áreas adjacentes, mas já está em fase de expansão. O governo indiano anunciou planos de transformar o NavIC em um sistema global e firmar parcerias com outros países, incluindo América Latina e África. Caso o Brasil busque esse caminho, a Índia poderia ser uma aliada estratégica tanto do ponto de vista tecnológico quanto diplomático.
Apesar dessas opções, ainda há desafios. O uso amplo e confiável desses sistemas no Brasil depende de acordos técnicos, diplomáticos e da adoção de equipamentos compatíveis. A maior parte dos dispositivos vendidos atualmente já opera com múltiplos sistemas GNSS, recebendo simultaneamente sinais do GPS, BeiDou, Galileo e GLONASS, o que proporciona maior precisão e segurança contra interrupções. No entanto, a estrutura nacional ainda é fortemente dependente da rede norte-americana, sobretudo em áreas como aviação, logística, agricultura de precisão e serviços de emergência.
A simples possibilidade de sanções envolvendo o GPS acende um alerta. Mesmo que um bloqueio seja improvável do ponto de vista técnico, o episódio reforça a urgência de o Brasil diversificar sua dependência tecnológica. Buscar acordos de cooperação com potências como China e Índia pode ser um passo importante para garantir a soberania digital e operacional do país.
O cenário também evidencia a necessidade de investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Um sistema de posicionamento regional próprio, mesmo que complementar aos sistemas globais já existentes, poderia assegurar ao Brasil maior autonomia em setores críticos.
A geopolítica moderna não se limita a embargos econômicos ou diplomáticos. O controle da informação, da tecnologia e da infraestrutura digital está no centro das disputas de poder. Para o Brasil, a melhor resposta talvez seja reduzir sua vulnerabilidade e ampliar suas opções. Nesse sentido, o diálogo com China e Índia se apresenta não apenas como alternativa viável, mas como estratégia essencial para o futuro.
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